segunda-feira, 1 de março de 2010

CONTRASTES

Após um breve interregno, tão duradouro quanto a publicidade da TVI, cá me apresento novamente, provinda da caserna onde descansei e ouvi a Berta Cardoso a cantar só para mim; lembrei-me que dantes até escrevia sobre fado... Recordei-me que o fado tem destas coisas engraçadas de pertencer a todos os tempos e não pertencer a nenhum.

Há aqueles fados que são intemporais e aqueles que se vê que pertencem bem a estes tempos, seja pela produção sonora, pelas soluções instrumentais, pela actualidade das letras, ou pela irreverência na interpretação. Penso ser interessante contrastarmos (e constatarmos) essa substancial diferença entre o “original” e a “versão”, o novo e o velho, o actual (de agora) e o intemporal (de outrora e por aí fora...); o recente que amplifica o passado e o passado que justifica a novidade, legitimando-se assim...

São duas interpretações de que gosto, que me agradam pelas suas diferenças e por aquilo que carregam em comum. Quero agradecer à minha vizinha da frente [N. do A., da frente, sendo assim mais fácil gritar “bom dia” e ela ouvir-me e ver-me, assim como pedir-lhe aqueles distintos raminhos de violeta que ela semeia à janela da cozinha] por ter-me enviado esta versão da Hermínia Silva ao vivo a cantar o fado que conheço como “A Rua Mais Lisboeta”. Da Aldina Duarte, a gravação que possuo é a que consta no CD “Mulheres ao Espelho”. Ainda da nossa Hermínia Silva podem encontrar uma gravação de muito boa qualidade no CD “O melhor de Hermínia Silva” editado pela iPLAY, 2008.


Hermínia Silva canta A Rua Mais Lisboeta (José Lourenço Rodrigues / Vasco de Macedo)




Aldina Duarte canta A Rua Mais Lisboeta (José Lourenço Rodrigues / Vasco de Macedo)



Cá p'ra mim a minha rua
É um risonho canteiro
Tem gatos miando à lua
Nos telhados em Janeiro

Tudo ali é português
Ai, tudo lá vive contente
Vive o pobre e o burguês
É pequenina talvez
Mas cabe lá toda a gente

Melhor nunca vi
Que a rua onde eu nasci
A rua é pobrezinha
Mas tem uma graça infinda
É humilde qual aldeia
Embora digam que é feia
Cá p'ra mim é mais linda

Não há ódios nem maldades
E tudo ali é singeleza
Não pode haver na cidade
Rua assim mais portuguesa

Ai, nada tem que seja novo
Essa rua da gentalha
E assim canto e me comovo
Pois é a rua do povo
Que labuta e que trabalha

12 comentários:

  1. Que bom, contar de novo com a sua companhia! Esperemos que não entre de novo em "Interlúdio",nos tempos mais próximos...
    A Hermínia é a Hermínia, mesmo qdº se engana e começa a cantar outra noutro fado...num espectáculo, creio que no S. Luís; mas emendou a mão rapidamente e fez o brilharete do costume.
    A Aldina é a Aldina.
    Então, a ouvir a Berta nessa intimidade?!... Bem!
    Que bom, tê-la de volta!

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  2. Saúdo o seu regresso ao blogue, ao fado e ao mundo da escrita.
    Keep on swimming... :)

    Seele

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  3. Vizinha, então pensava que a tal senhora era só para si, não?
    É verdade que a B.C. é de domínio público, mas tão desconsiderada que pertence apenas aos deleites privados de alguns. E eu cá não me importo nada com isso:)
    E já agora, a Hermínia era uma malandrona, não era? Diga-me lá... já que a conheceu. Ela "enganava-se"?

    Seele, obrigada por estar sempre atenta. Mas regresso regresso só mesmo à escrita e ao blogue. É que do fado nunca saio, mas isso a menina já sabe!

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  4. No había oido nunca la versión de Hermínia pero, realmente, le encuentro muchas similitudes con la de Aldina. Ambas me gustan.

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  5. Por muito que goste de Aldina Duarte, que aqui parece querer imitar a voz "original"...Hermínia é a minha preferida.
    De longe!

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  6. Olá José! Ou são os ouvidos que me traem ou realmente não me parece nada uma imitação. A Aldina é das poucas fadistas contemporâneas (de agora)que tem uma forma muito própria de cantar, assim como uma voz muito característica. Não é uma grande voz, mas canta com um sentimento muito especial que, se calhar, até se aproxima do que o fado pede. Acho que é essa a similaridade que encontro. Tudo o resto é contraste:)

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  7. Como gostei tanto deste blog, vou voltar certamente.
    Bem haja.

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  8. TiMariaBenta, desculpe incomodar, mas não percebo desta coisa de blogues... gostava de pôr uma questão, a ver se me podia ajudar (ou as pessoas que leem este blog...) sobre o título dum fado que a Hermínia canta na sua (dela) festa de homenagem e que não encontro em lado nenhum por mais que eu "google"! Obrigado!

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  9. Olá Mike! Em primeiro lugar, não incomoda nada.
    Em segundo lugar vai ter de ser mais específico. A Hermínia, na festa de homenagem, cantou vários fados. É capaz de escrever-me um excerto da letra para ver se eu lá chego?
    Obrigada

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  10. Obrigado, Ti Maria Benta pela sua resposta tão rápida!
    Vou então deixar-lhe a letra do fado que lhe falei - contém algumas imprecisões e dúvidas, mas é mais ou menos assim:

    (Ai) não me digam que é de Pádua
    Santo António de Lisboa
    (bis)
    sou Portuguesa e há mentiras
    que um Português não perdoa
    (bis)

    Ai vela por nós, Santo António
    Que a tua (...) sem rival
    (bis)
    Ilumina agora e sempre
    A gente de Portugal
    (bis)

    Ai no meu bairro noite e dia
    Há alegria e há virtude
    A virtude de alegria
    O que é preciso é folia
    Haja saúde!

    Ai não sei de coisa mais nossa
    Nem (...) mais singela
    (bis)
    Que um vaso de mangerico
    Posto ao relento à janela
    (bis)

    Um palácio de guitarras
    Se eu pudesse, construía
    (bis)
    Com janelinhas bizarras
    Que dessem p'rá Mouraria
    (bis)

    Ai no meu bairro noite e dia
    Há alegria e há virtude
    A virtude de alegria
    O que é preciso é folia
    Haja saúde!
    (bis)

    Obrigado mais uma vez.

    Cumprimentos
    Mike

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  11. Mike, ainda não me esqueci do seu pedido mas tenho andado com uma irremediável falta de tempo. Assim que conseguir, comunicar-lhe-ei por esta via.
    Cumprimentos.

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