quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Pequenas Felicidades

É raro existirem fados assim. Fados positivos no que respeita ao amor. Lá que são positivos nas touradas, nas frescatas, na bebedeira, na rambóia, ou no que lhe quiserem chamar, disso não existem dúvidas. Mas fados de amor eterno, em que existem certezas na ligação entre duas almas, são caso de rara existência.

Quantas vezes não deparamos nós com os fadinhos chorados acerca da mulher abandonada, traída, humilhada e desrespeitada pelo marialva que anda a pisar em ramo verde, tendo ainda a lata de "gingar petulante, em ar de provocação" à frente da desgraçada? E depois, como "gosto de ti quando mentes", pensam elas que, ao recuperá-lo, tiveram uma grande vitória sobre a amante e assim acaba o fado! Claro que não... porque segue direitinho para a faixa seguinte onde "iludiste duas vidas, com mil palavras fingidas, que não sentiste nem sentes". E lá vai mais uma voltinha!

Só com o Chico e a Glória é que houve peixeirada da grossa que depois deu num lindo zarolho. Final feliz! Diz que na Travessa da Palha houve um cantar ao desafio entre as duas mulheres e a traída levou o marialva p'ra casa. Final feliz! E como "a mentir-me tens amor". Final feliz! "Mas eu sinto, meu amor, que escondes seja o que for, e fico preocupada". Pois claro, não se queixe!

Todavia acredito que, no meio tudo isto, deste desassossego, angústia, indignação, ainda exista espaço para pequenas felicidades, pequenos momentos que, mesmo que não durem uma eternidade, que não sejam um grande fado, são bons! Há sempre a hipótese de "alguns meses depois" voltar ao baile, "com outra blusa nova e out'xaile"... e ver o que acontece!

Por isso, enquanto o marialva foi aos toiros e sabe-se lá que mais, minha senhora, ouça este fado:

PEQUENAS FELICIDADES (Moniz Pereira)
Canta Lucília do Carmo



O nosso amor são pequenas felicidades
São sorrisos, são tristezas
Algumas leviandades
E também muitas certezas
Cresce sempre, nunca cansa
Tudo nele são verdades
A certeza não é esperança
Não tem lugar para maldades

O nosso amor são pequenas felicidades
São sorrisos, são tristezas
Algumas leviandades
E também muitas certezas
Aumenta todos os dias
Desde manhã ao sol-pôr
Aquece as noites mais frias
Enfim, é o nosso amor

O nosso amor são pequenas felicidades
São sorrisos, são tristezas
Algumas leviandades
E também muitas certezas
Um dia, tem de morrer
Muitos virão depois
Quando isto suceder
Já cá não estamos os dois


Bom fim-de-semana!

5 comentários:

  1. Pequenas Felicidades é o que levamos desta vida. Não há uma felicidade continuada (a não ser que estejamos sobre o efeito de algum químico), há momentos felizes com pessoas que nos fazem sorrir, que nos fazem bem, que aquecem a nossa alma, o nosso intelecto e o nosso coração. Tomara muitos terem pequenas felicidades. Confesso que a minha, neste momento, é Grande.
    Avlis ad Onistirc

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  2. É verdade.
    O Fado não tem de ser sempre a história dos "desgraçadinhos".

    Longe disso.

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  3. Existem mesmo estas boas excepções. Embora a felicidade não faça (muita) história, nem o fado nem outras formas de arte desconsideram a sua existência, nem que seja para legitimar/actualizar o dramatismo.
    Obrigada pela visita.

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  4. um grande exito tambem do saudoso manuel de almeida que tanta gente se tem esquecido a radio amalia por exemplo que so qd pedem e que passam a musica de um grande fadista a par de tantos outros que me ensinaram a gostar de fado aproveito para informar que em queluz em fevereiro na passagem do 10º ando de sua morte vai haver uma homenagem a outro grande fadista esquecido natalino duarte

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  5. Obrigada por ter visitado este blogue (praticamente) moribundo Luís. Tem toda a razão. Há imensos fadistas/cançonetistas esquecidos. Imensos letristas esquecidos. Mas, se pensarmos bem, não estão assim tão esquecidos, porque ainda há muita gente que fala deles, apesar de não se encontrarem nos circuitos comerciais. Quanto a Natalino Duarte, aí está outro fadista do qual gosto muito. Obrigada pela informação e pelo seu comentário.

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