sábado, 11 de julho de 2009

Fracasso...

Música Fado Menor com Versículo da autoria de Alfredo Marceneiro; Poesia de Linhares Barbosa, interpretada pela áurea voz de Berta Cardoso.



FADO FRACASSO
(Linhares Barbosa/Alfredo Marceneiro)

Quando há bocado me viste reparaste,
Que eu trazia um ar cansado, um ar doente,
Eu ando cansada e triste e arrependida
De ter andado a teu lado ultimamente.

Jurei aos pés do altar, piedosamente,
E jurei a uma Virgem de olhos doces,
Em sempre te acompanhar como uma sombra
Fosses tu ao fim do mundo, aonde fosses.

Mas um dia, um dia veio, um dia não,
Reparei que o teu amor era aparente
E fiquei abandonada, desprezada,
porque tu sem reparar seguiste em frente.

Eu cansei de ser sombra, de ser crente
E por isso tu me viste com cansaço,
Arrastando tristemente e arrependida
A falência do meu sonho, o meu fracasso.

Polémicas...
Este fado fez-me lembrar a polémica que li sobre o Versículo de Alfredo Marceneiro ter sido apropriado como criação original por Carlos do Carmo. Não me choca o silêncio que se gerou sobre esta matéria pois, nos dias que correm, questões de autoria são complicadas e chegam a ser muito ténues. Também o são as questões da originalidade, tendo em conta que ser-se original é raro, todos nós apropriamos e recriamos, uns mais do que outros, e umas vezes mais do que outras.
Dizer que o "Fado da Saudade" não tem relação directa com o Versículo do Marceneiro é um disparate, embora as respostas nesse sentido tenham sido ambíguas. No entanto acredito que Carlos do Carmo tenha levado a sua ideia avante porque criaram-se linhas de guitarra novas numa mesma matriz (fado menor) e um poema novo como base. As notas musicais para as linhas de voz mantêm-se as mesmas e a componente do versículo ficou, infelizmente, diluída no conjunto. Tratou-se de uma semi-criação.
O mundo do fado, como algo tão elástico que é, onde até é costume utilizar temas musicais para servir de suporte a diferentes poemas, não entendo qual seria o problema em usar um pouco de bom senso e ter reconhecido de início o tão proclamado autor. No fundo andamos todos aqui por amor ao mesmo, digo eu... aqui no Soldado é garantido.
No final, o que permanece é o mais importante. O Fado.


Fontes:
Lisboa no Guiness
Polémicas
fadocravo

4 comentários:

  1. Costuma o povo dizer cinicamente, mas com uma certa razão, como é costume, que "Não há vigaristas, o que há é anjinhos"!... vem isto a propósito...sei lá!esta memória,já não é o que era, mas não interessa. Lembrei-me doutro dito que, se calhar, tb. tem a ver com o tal assunto "Não suba o sapateiro além da chinela" ou mesmo "Quem te manda a ti, sapateiro, tocar violão", isto por causa dos que dissertam acerca do que não sabem ou mesmo galardoam sem antes avaliarem devidamente a prova...como aqueles profs. que classificam provas de acordo com o sítio onde aterram... Tb. não deixa de não ser grave validar o erro... ainda se o busto ficasse lá por casa, para exibir à família e amigos, a lembrar "Vê lá tu como enganei aqueles palermas!", porreiro!, agora assim!?...
    Bem, o que eu quero dizer e é mesmo mais importante, como diz a Comadre, é que este Menor com versículo não podia ser mais bem interpretado! (repare que digo "mais bem" e não "melhor" como erradamente se usa dizer nos dias que correm; a regra está na gramática)Voltando ao "Fracasso", se ficou bem nesta gravação, pena que não tenha "ouvisto", como eu, ao vivo e a cores! (ou terá visto?...)É que Berta Cardoso, para além de uma grande voz, era igualmente uma enorme "performer" (desculpe o anglicismo, mas "noblesse, oblige"). Ficaram-nos poucas gravações de Berta Cardoso e, nisso, o Fado perdeu; mas ganhou o Fado e todos os que dele gostam com a excelência dos registos que Berta Cardoso nos legou. Se é facto que o fado tem a cor ( de colore e de cor,cordis) da alma do seu intérprete, este não o podia ter mais!...

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  2. Resposta ao coment, deixado no meu blog, em resposta a este meu coment, aqui deixado:
    ...AIROSO!...
    Na mouche!, Comadre

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  3. E uma Berta Cardoso muito injustamente esquecida, na era das "novas" fadistas, imitações baratas e más da grande Amália.

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  4. Caro José, muito obrigada pelo seu comentário!
    Eu tenho uma leitura sobre fadistas (ou outros artistas) que caem no esquecimento: hoje em dia se falar a um jovem sobre fado, falam-lhe da Mariza. Se falar com um adulto, reconhecem a Amália. Se falar com um apreciador de fado no geral estabelece-se uma conversa sobre variados fadistas e pode eventualmente chegar-se à Berta Cardoso. Ou seja, fadistas como a Berta Cardoso, só surgem no âmbito do nosso conhecimento se pesquisarmos um pouco mais. É um pouco como acontece com outros estilos musicais, com as descobertas que vamos fazendo, até chegarmos àqueles artistas que nos fazem perguntar "como é que isto caiu no esquecimento? Porque é que ninguém fala disto?".
    Quanto às novas fadistas, eu procuro não me manifestar sobre o que não gosto. Ando mais nestas lides do blogue para procurar prazer e sossego. Generalizando, existe por aí muita falta de sentimento e espírito. Eu nem sequer exijo uma voz virtuosa... mas o resto é indispensável.

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