terça-feira, 6 de outubro de 2009

CANSAÇO



Cansaço (Joaquim Campos / Luís Macedo)

Por trás do espelho quem está
De olhos fixados nos meus?
Alguém que passou por cá
E seguiu ao Deus-dará
Deixando os olhos nos meus.
Quem dorme na minha cama,
E tenta sonhar meus sonhos?
Alguém morreu nesta cama,
E lá de longe me chama
Misturada nos meus sonhos.
Tudo o que faço ou não faço,
Outros fizeram assim
Daí este meu cansaço
De sentir que quanto faço
Não é feito só por mim.


Juntamente com esta súbita mudança de tempo, sobretudo (mas não só) por este tempo cinzento, chuvoso, húmido, veio-me à memória o único fado que não consigo ouvir até ao fim. Quer dizer, não é o único, existe outro que, um dia, partilharei convosco, mas direi que foi este o primeiro a brindar-me com o seu inefável arrepio. Até poderia dizer, aqui pelas minhas determinações pessoais, que este poema tem tudo. Perdoem-me o cliché, que também se aplica a alguns poemas escritos pela Amália, mas realmente temos o prazer, ocasionalmente, de nos depararmos com obras de arte como esta, que nos trazem tudo. E isso não é bom. Nisso mesmo reside o seu encanto. Portanto, fazendo apelo a este masoquismo muito pessoal, partilho com todos vós este fado, que todos já conhecerão, em parte, por partilharem essa experiência que acredito que também vos seja intensa, por outro lado, acompanhando estas recordações de Amália Rodrigues por ocasião dos 10 anos da sua morte.

Agradeço a quem trouxe Amália aos meus sentidos e a quem me trouxe ao Fado, conseguindo também trazer-me a mim.

2 comentários:

  1. este fado cantei uma vez no Hermansic em 2003.é um dos classicos de Amalia,pela força telurica da sua interpretação e pelo poema de Luis de Macedo
    valeria mendez

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